sexta-feira, 8 de julho de 2011

Lobos...

E eu vi nos seus olhos, grande parte do que me possuíria...
Entre as folhagens navegava o mar adulto e se sabia homem, quando enfim era lobo.
Adornando a presa, mantinha-a estática sobre o leito de morte a que a propusera. Lavando a terra em lágrimas dos filhos de Deus, o clamor mais alto e forte que estremeceu e calou seu uivo.
Despencou entre árvores, arrastando-lhe doce, o mel da transa.
Entre deuses acentada, lobo viríl entre espadas, cedeu-lhe o primeiro beijo, arrematando-se incensada.
Tecia a mortalha... Desejando dia após dia enterrar seus monstros nela... Mas os ressuscitava ao fim do dia, como se não lhe restasse nada.
Era uma noite e um tardar do dia... E todo o seu impacto se dava em falsas maravilhas.
Propuseram-lhe a coroa, mas prostrada não soube dizer nada. Partiu então o homem a desbravar a mansão dos mortos em noites infindáveis.
Descansou o corpo sobre o carvalho, abastou-se da vida para no futuro rever os olhos uivantes da amada.
Caminhou entre os desertos da alma e presenciou os labirintos da mente... Viveu as tardes de uma feiticeira, mas seus encantos não foram mais fortes do que o de sua adorada.
Sobre o seio da terra, ela o esperava... 
E quando a vida partia soube dizer: "Os meus olhos não fecheis nessa agonia. Viverei meus olhos para que ao retornar, ainda em ti, eu esteja viva."
Em dias de chuva, retornava o homem...
Cavalgou depressa, sabendo sem ver o que encontraria. Viu-se homem, quando era agora lobo, sem alcatéia, liberto dos amores, condenado a sua própria prisão a tecer ele mesmo a sua mortalha.
De longe, soube... A que ponto seu monstro o dominara... Viu-se em queda derramar na terra lágrimas dos filhos de Deus. 
Fechou-lhe os olhos uivantes.
Ofereceram-lhe a coroa, mas prostrado ele não soube responder...
Virando-se, forjou a espada... Soube-se nú... 
Converteu-se o homem em lobo e rasgou o tempo no peito para gritar seu luto entre as luas de sua quimera... 

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Vício...

Em pé, atrás da porta eu era observada...
Estava lá a horas, talvez dias e eu se quer, sabia fingir que não via...
Seu cheiro cobiçando o meu era audível em todo canto das minhas sensações.
Ao fazer as malas, eu devia pensar que entendia o meu recado e devia saber que não bastaria...
Sempre que estivemos juntos havia um porque... Um motivo especial... Mas agora não... Era só a questão da convivência, que nos aprisionara... Nem eu e nem eu... Sim. Sabia libertar-me disso.
A divergência dos risos...
A intocabilidade dos gostos...
A sustentabilidade dos gestos...
Eu te bebia, vinho tinto em taça de prata... Embebedava-me... E como todo bom bebedor, viciei-me e como todo vício, vi-me definhar dia após dia, em cada degustação.
Mas enquanto isso... Em pé atrás da porta eu era observada...
E sua observação era dissecadora...
Tremi... Temi... Menti que seu toque não era sentido... Eu sentia na sua ausência... Eu senti...
Tive minha crise de abstinência e não foi fácil...
Enlouquecia e quando usavam palavras para prender-me e frustrar meus planos de ir de novo atrás desse... Desse vício...
Todos os dias da minha morte... Eu morri de amor... Morri de loucura... Morri de medo... Morri de alegria... Morri... Morri...
E nos piores momentos, só minha alma soube bem fazer luto de mim... Nem nos precisamos palavra...
E enquanto isso...
Em pé atrás da porta eu era observada...
E essa imagem refletida era nada, senão outro eu de mim mesma, encarada, incompreendida, em construção e desconstrução...
O meu fragmento de tantos outros, que se expôs assim, sem precisar traduzir-me. Apenas era. ía sendo... Inventando-me... Recriando-me... Reciclando-me... Sendo amores, versos, gestos, reflexos, fragmentos, vício... Todo dia.
Em cada dia.
No meu vício de você... Embebedando-me na doçura de uma alma inacabada...
Eu ia também tecendo algumas cascas dentro da minha concha... Mas isso é um outro conto, uma outra história que não cabe aqui, neste momento...
E assim, 
Em pé atrás da porta eu era observada...

Valsa

Não gosto quando ela se aproxima assim... Mas sempre a recebo... Mesmo que não tenha vindo dessa vez a minha casa, parece que ela faz que...