sexta-feira, 3 de setembro de 2010

O tempo...

Eu estou cansada.
A quem estou tentando enganar?
Não pertenço a isso e você sabe...
Queria viver no mundo das idéias apenas. Aliás vivo, sou muito mais viva.
Eu não quero que pareça mais um clichê de quem quer sair do mundo. Mas quero sair desse mundo. Preciso...
...
Eu estava lá dessa vez, nos encaramos durante horas.
De repente pegamos o casaco e saímos.
Estava anoitecendo. Estava frio e íamos falando sobre o tempo durante o percurso. Mas você ainda sabia quem eu era e eu também.
Estava ameaçando chover naquele noite, mas eram só ameaças... Eu jurava que não podia acontecer.
Eu me sentei frente a lareira. Apenas eu, você e uma taça de vinho tinto como de costume.
Nos olhamos demoradamente. Era diferente. Havia algo mais...
O que acontece agora? Vamos... Pode escancarar a verdade.
Ponha as palavras na mesa. Melhor... no chão. Melhor... na minha taça de vinho.
Quer se vingar? Me envenene com as suas palavras.
Assim eu pensava e desejava. Mas ela não se moveu.
Eu bebia o vinho. Ela também. Eu suspirava. Ela também. 
Eu tremia as mãos. Ela também. Eu chorava...
Ela também, mas depois sorria...
Levantei-me. Pensei deixá-la pensar sobre o que me diria dessa vez.
Despi-me. Deixei a água tocar minha nuca. 
Surpresa...
Lá estava ela, encarando-me.
Analisando minha nudez. Ridicularizando-me.
Pronto!!
Basta!!
Eu não posso mais!! - gritei. O cachorro na rua latiu.
Como tudo começou?

Bem, não sabemos.
Tenho vagas lembranças de que um dia...
Ela me tortura. Quando quer odiar, odeia. É covarde. Depois foge e me culpa.
Me fez sua máscara.
Não quer me matar! É fato! Mas travou batalha comigo no ringue que vai da alma a pele.
E dói!
Faz doer!
E ama e odeia isso!
Minha hóspede...
Sabe. Eu não queria que fosse assim.
Nem sempre foi.
Olha no que nos tornamos? Um turbihão. Um nevoeiro. Você não ganhou nada com isso, nem eu. Era de se esperar que nos dessemos bem. Não há como arrancá-la de mim. Se o fizesse antes, teria que...
E a culpa não é sua. Eu abri este mundo, que parecia inóspito.
Quis ir pra lá, fugir das formas e das coisas, para viver as cores, as lembranças e os gestos, ou pelo menos a vontade deles existirem.
É tudo melhor aqui e você sabe.
Quando foi que chegamos aqui então?
Esse ódio que há entre nós. E a necessidade de roubar o mundo do outro que nunca foi seu "apenas" e sim nosso.
Ocupamos o mesmo espaço, o mesmo tempo, o mesmo tudo até chegar no momento em que nossa compatibilidade é pobre.
Você, meu eu. 
Meu eu que invejo, porque pode gritar. Você pode perder as estribeiras. Eu não.
Tenho que vestir meu terno cinza todas as manhãs, afogar-te, assassinar-te.
Sim. Eu sei. Sou a vilã!
É porque queria ter a sua liberdade de alma e pele. Ela é maior, do que a minha liberdade de mundo. Muito maior.
Eu? Ainda está aí? Bem, não vá. Te preciso, mesmo que seja nessa confusão.
Façamos um trato?
Fique! Amanhã te pago outro chá.
Conversaremos mais tarde.
Dizem que o tempo absorve todas as coisas. Eu não acredito que te absorva, nem que me absorva.
Mas pelo menos agente pode tomar chá...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Valsa

Não gosto quando ela se aproxima assim... Mas sempre a recebo... Mesmo que não tenha vindo dessa vez a minha casa, parece que ela faz que...